Um novo olhar na reestruturação de comunidade carente do sul do Brasil

maio 14, 2015
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Student Ana and teacher Sandra, from Brazil, discuss project.Student Ana and teacher Sandra, from Brazil, discuss project.A cabeça baixa, o sorriso envergonhado e a ruborização dão sinais de que Ana Carolina está vivendo uma situação totalmente nova. Com a voz meio embargada e tom baixo, a estudante de 15 anos agradece a dezenas de estudantes da Universidade de Michigan pela dedicação que tiveram ao trabalhar por meses em um projeto para ajudar a pequena e discriminada Santa Marta, bairro em que ela vive no sul do Brasil.

“Estou muito feliz e entusiasmada porque acredito que vamos conseguir implementar na minha comunidade muitas das sugestões dos estudantes de mestrado da Escola de Arquitetura e Planejamento Urbano. Mal posso esperar para dividir os resultados e começar a colocá-los em prática,” explica Ana, que saiu pela primeira vez de perto da família e de São Leopoldo.

Viagem conquistada depois de muito trabalho. Há quase dois anos e meio, Ana faz parte da Comissão de Meio Ambiente e Qualidade de Vida (Com-Vida), da Escola Municipal Santa Marta, criada para debater problemas e soluções relacionados à área de meio ambiente, além das questões sociais do bairro e para tentar mudar o estigma da comunidade. “A maioria das pessoas tem vergonha de morar no bairro. Eu mesma já sofri muita discriminação por ser moradora do Santa Marta,” explica.

Depois de perder um amigo assassinado e ter dois irmãos presos por assalto, Ana decidiu transformar revolta e tristeza em mobilização e passou a trabalhar para o fim da discriminação e preconceito contra Santa Marta, que hoje tem em torno de 7 mil moradores. O projeto ganhou força depois que a professora de Educação Ambiental Sandra Grohe comprou a ideia e passou a trabalhar bem perto dos estudantes.

U-M students work in Santa Marta, Brazil.U-M students work in Santa Marta, Brazil.“Entendi que uma mudança era imprescindível para qualquer tipo de progresso da comunidade, que sofria com brigas constantes e destruição do patrimônio. Os alunos tinham que começar a aprender a cuidar da sala de aula, do próprio espaço, para depois poder expandir a noção do que é cidadania para o bairro,” diz Sandra.

O Com-Vida chamou a atenção de um grupo de mestrandos do curso de Urbanismo Ambiental, da U-M, através da PUC-RS. Em março, dez deles, juntamente com a professora brasileira Ana Paula Pimentel Walker, da Escola de Arquitetura, passaram duas semanas em Santa Marta para estudar e levantar dados estatísticos. O trabalho de campo serviu como projeto de conclusão do curso em planejamento urbano.

“Vi que podíamos ajudar Santa Marta e aprender ao mesmo tempo. Foi uma experiência colaborativa de aprendizagem. Agora realmente espero que nossas sugestões sejam implementadas. Gostaria do fim da discriminação e que a estrutura urbana de Santa Marta recebesse muitas melhorias,” diz Ana Paula.

Nas sugestões, os estudantes enfatizam que a comunidade, o poder público e parceiros externos terão que trabalhar juntos para mudar a realidade. Um primeiro passo é fazer um mapeamento interativo da comunidade, com a elaboração de um inventário dos espaços públicos, das áreas propensas a inundações, dos descartes de lixo excessivo e irregulares e das áreas com iluminação pública precária.

Entre outras responsabilidades, caberá à comunidade trabalhar em diferentes categorias do orçamento participativo, como a da saúde, para a construção de novos postos de saúde, a da segurança, para a luta por mais policiamento, além da educação, para melhorias nas instalações das escolas, criação de novas escolas e programas educativos.

Os estudantes também enfatizaram a importância de uma campanha pública, para compartilhar informações, mudar a percepção sobre a comunidade, reunir pessoas e desenvolver alguns planos de ação.

Rua da Fumaça
Entre as sugestões para mudar a realidade de uma das áreas mais problemáticas do bairro, os estudantes propõem a renomeação da rua, usada para queima e descarte de lixo, a pavimentação para pedestres, iluminação, implantação de lixeiras e plantas nativas, uma programação mensal com o fechamento da rua para uma feira ao ar livre e a criação do grupo “Embaixadores – Mantenha a rua limpa”, que deverão monitorar os descartes de lixo na área.

A diretora da Escola Municipal, Marcia Kehl, que também veio para a apresentação, sabe que terá muito trabalho ao voltar para casa. “O projeto nos oferece embasamento riquíssimo. Agora é a hora das cobranças, de batalhar juntos às secretarias e parceiros para levantarmos verba e colocarmos em prática tudo o que aprendemos em MI,” explica.

Depois de 3 semanas fora de casa e longe da família, a menina Ana só tem agora um sonho. “Quero o fim da discriminação e violência. Quero que as pessoas tenham orgulho do nosso bairro e sintam prazer em viver lá, não vergonha. Quero realmente fazer parte do grupo que vai transformar Santa Marta,” diz com os olhos marejados e cheios de esperança.